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MANUEL DA FONSECA
( Portugal )
Manuel Lopes Ferreira Fonseca, mais conhecido como Manuel da Fonseca ComSE (Santiago do Cacém, 15 de outubro de 1911 — Lisboa, 11 de março de 1993) foi um escritor (poeta, contista, romancista e cronista) português.
Após ter terminado o ensino básico, Manuel da Fonseca prosseguiu os seus estudos em Lisboa. Estudou no Colégio Vasco da Gama, Liceu Camões, Escola Lusitânia e Escola de Belas-Artes. Apesar de não ter sobressaído na área das Belas-Artes, deixou alguns registos do seu traço, sobretudo nos retratos que fazia de alguns dos seus companheiros de tertúlias lisboetas, como é o caso do de José Cardoso Pires. Durante os períodos de interregno escolar, aproveitava para regressar ao seu Alentejo de origem. Daí que o espaço de eleição dos seus primeiros textos seja o Alentejo. Só mais tarde e a partir de Um Anjo no Trapézio é que o espaço das suas obras passa a ser a cidade de Lisboa.
Membro do Partido Comunista Português (PCP), Manuel da Fonseca fez parte do grupo do Novo Cancioneiro e é considerado por muitos como um dos melhores escritores do Neorrealismo português. Nas suas obras, carregadas de intervenção social e política, relata como poucos a vida dura do Alentejo e dos alentejanos.
A sua vida profissional foi muito díspar, tendo exercido nos mais diferentes sectores: comércio, indústria, revistas, agências publicitárias, entre outras.
Era membro da Sociedade Portuguesa de Escritores quando esta atribuiu o Grande Prémio da Novelística a José Luandino Vieira pela sua obra Luuanda, o que levou ao encerramento desta instituição e à detenção de alguns dos seus membros na prisão de Caxias, entre os quais Manuel da Fonseca.
A 25 de outubro de 1983, foi agraciado com o grau de Comendador da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada.
Livros de Poesia: Rosa dos ventos - Edição do autor
Planície; Poemas dispersos – 1958; Poemas completos – 1958, com prefácio de Mário Dionísio.
Biografia: https://pt.wikipedia.org/
MEIRELES, Cecília. Poetas Novos de Portugal. Seleção e prefácio de Cecília Meireles. Rio de Janeiro: Edições Dois Mundos Editora Ltda, 1944. 315 p. (Coleção Clássicos e Contemporâneos, dirigida por Jaime Cortesão. Ex. bibl. Antonio Miranda
RUAS DA CIDADE
Na noite calada e quieta como um grande segredo,
andando ao deus-dará nestas ruas desertas,
sai lá do fundo do meu sonho
e olho ao redor de mim.
Cá fora há tudo o que não é do meu sonho:
o frio, e os altos prédios fechados,
e as ruas mortas com paisagem de cemitérios.
E a claridade fugidia dos candieiros cansados,
como pálpebras que se vão fechar.
E o torpor saindo de todas as coisas
e pairando no ar, como um desmaio iminente...
Só eu tenho ainda passos para andar
e uma não sei que ternura
para todos que estão, para lá das paredes
adormecidos e descuidados
à morte que espreita escondida no mistério da noite...
Em que casa e andar estará dormindo
aquela de quem não sei o nome nem a vida,
mas decorei a cor dos cabelos e a melodia do corpo,
quando nos cruzamos esta manhã?
Nesse momento,
ou fosse porque chovia sol sobre a algazarra de gestos
das gentes que iam e vinham e se falavam e continuavam,
ou porque nos olhássemos de certa maneira que não
[saberei contar,
mesmo de longe, dissemos com os olhos, sum para o outro
— Hoje é um dia de glória!
Mas tão estranho me pareceu
aquele milagre entre dois desconhecidos,
que nem voltei a cabeça para trás.
Agora, este desânimo sem nome
de quem traiu um dia inteiro de vida
e teima ir pele noite dentro
à espera nem sabe de quê...
De tantas horas iguais, estou farto!
Mas ao fim e sempre, a mesma esperança:
“um dia virá...”
E eu tenho a vida desarrumada
como se fosse um milionário bêbado,
erro-me e saio para a rua deslumbrado
e ressuscitado, todos os dias, ao amanhecer.
E vai a coisa tão certa como uma religião,
quando pressinto que me olham d todas as caras
como se espiassem um louco...
Onde estão ouvidos que entendam as minhas falas?
E a noite vem encontrar-me deserto e abandonado...
Ah, um dia, quando a morte chegar,
hei-de erguer para ela os meus olhos molhados,
e hei- de contar-lhe a indiferença do mundo
e a amargura dos altos sonhos desfeitos...
— assim como um menino fazendo queixas a sua mãe.
“Rosa dos ventos”
O VAGABUNDO DO MAR
Sou barco de vela e remo
sou vagabundo do mar.
Não tenho escala marcada
nem hora para chegar;
é tudo conforme o vento,
tudo conforme a maré...
Muitas vezes acontece
largar o rumo tomado
da praia para onde ia...
Foi o vento que virou?
foi o mar que enraiveceu
e não há porto de abrigo?
ou foi a minha vontade
de vagabundo do mar?
Sei lá!
Fosse o que fosse
não tenho rota marcada
ando ao sabor da maré.
É por isso, meus amigos,
que a tempestade da Vida
me apanhou no alto mar.
E agora,
queira ou não queira,
cara alegre e braço forte:
estou no meu posto a lutar!
Se for ao fundo acabou-se
E tais coisas acontecem
aos vagabundos do mar.
“Rosa dos ventos”
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Página publicada em abril de 2022
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